Embora por
muito tempo o foco de boa parte dos estudos em neurociência tenha sido sobre
doenças e causas variadas de infelicidade e mal-estar, uma bem-vinda extensão
do enfoque nos últimos anos fez com que a neurociência passasse a se interessar
também pelo normal: como o cérebro se mantém saudável, o que nos causa prazer e
felicidade, o que é o bem-estar e como alcançá-lo. Eis algumas lições
aprendidas até o momento, que podem ser usadas por você também:
Cuide bem de sua saúde física
Seu cérebro é
quem cuida do funcionamento integrado do seu corpo como uma unidade coesa, e
nesse sentido seu corpo precisa do seu cérebro. Mas o contrário também é
verdade: seu cérebro precisa do seu corpo e os problemas deste doem nele. É
preciso saber respeitar o corpo, reconhecer seus problemas e limites,
respeitá-los e tratá-los rapidamente. Além disso, investir na saúde do corpo
traz grandes benefícios para a saúde do cérebro ao longo de toda vida principalmente
na velhice. Tudo está bem quando corpo e mente vão bem.
Identifique e cultive seus prazeres
Longe de ser
um luxo, a sensação de prazer é base do bem-estar. É a antecipação de um mínimo
de prazer ou bem-estar, durante o dia pela frente, também chamada de motivação,
que nos tira da cama pela manhã; é essa busca pelo bem-estar que nos move. O
mesmo vale para autoconfiança, antecipar o sucesso é um grande empurrão em sua
direção. Como o mesmo sistema cerebral é responsável pelo prazer e pela sua
antecipação, quem tem a vida cheia de prazeres é justamente por isso também mais
capaz de antecipar acontecimentos positivos. Busque identificar suas fontes de
prazer e cultive-as: amigos, namoro, trabalho, lazer, exercícios físico e
mental.
Ouça suas emoções
O estado do
corpo é a base das emoções: sentir uma emoção é detectar as mudanças efetuadas no
corpo pelo cérebro. Hoje se aceita que as emoções são parte fundamental nas
boas decisões. Elas avisam rapidamente sobre o resultado de experiências
passadas semelhante, antes que você tenha tempo para pensar racionalmente e,
portanto devem sempre ser ouvidas. Se “alguma coisa” lhe di não ouça com
atenção: é seu corpo mandando avisos ao cérebro sobre o que eles dois aprenderam
juntos ao longo de sua vida.
Sorria e busque a felicidade
Felicidade é o
estado que vê tudo dar certo. Além de mexer no cérebro, a felicidade afeta o
corpo deixando-o mais saudável. Se tudo de fato está dando certo e você está
cheio de energia, ótimo. Em alguns casos, no entanto, a felicidade e a
motivação são desmedidas, exageradas e não refletem a realidade da vida: isso é
uma indicação de mania, condição que à primeira vista parece benção, mas
rapidamente se torna maldição.
Saiba a diferença entre tristeza e
depressão
A tristeza é
uma emoção importante e útil e, em algumas situações extremas a tristeza profunda
é a única resposta razoável de um cérebro saudável e não deve ser confundida
com depressão. Tristeza profunda é aquela perfeitamente justificável, que deve
ser respeitada; depressão é a tristeza despropositada e deve ser tratada como caso
clínico. Um cérebro saudável é capaz de se sentir profundamente triste – nas horas
certas.
Tenha uma atitude positiva
Ter uma
atitude positiva em relação à vida é fundamental. O otimismo favorece a
ativação antecipada do sistema de recompensa ( ou seja, a motivação) e com isso
suas chances de partir para a ação; aumenta sua satisfação com os feitos
alcançados e suas chances de fazer algo realmente dar certo; faz você lidar
melhor com situações negativas; e até melhora a resistência a doenças.
Tire proveito do estresse agudo
É fundamental
que cérebro e corpo saibam identificar situações ameaçadoras ou situações que
exigem respostas e reagir de acordo – e “de acordo” é justamente a resposta ao
estresse. Se o cérebro não soubesse identificar situações estressantes e reagir
a elas, mal chegaríamos de pé ao final do dia. Por isso uma resposta ao
estresse é vital. Adoramos ter problemas para resolver – desde que nos sintamos
capazes de resolvê-los e, sobretudo se os procuramos voluntariamente (palavras cruzadas
e os jogos do Cérebro Melhor são bons exemplos!). O estresse agudo desse tipo,
desejado e voluntário, tem efeitos benéficos sobre a memória e a resposta
imunológica. A resposta imediata ao estresse é desejável: se não for muito
intenso, o estresse facilita a memória, nos deixa mais atentos, e ainda aumenta
a imunidade.
Aprenda a lidar com a ansiedade
Além de
simplesmente reagir, o cérebro sabe antecipar possíveis situações estressantes.
Algumas preocupações são saudáveis e geram um estado de resposta imediata ao
estresse chamado de ansiedade, que tanto pode ser percebido, como desejável (a
excitação da expectativa) como indesejável (a angústia da expectativa). Em
doses saudáveis, no entanto, essa habilidade de preocupar-se por antecipação é
uma benção, pois evita que o cérebro se coloque em situações problemáticas.
Preocupar-se é importante - desde que nas horas certas.
Faça as pazes com os remédios
O bom funcionamento
do cérebro depende de um equilíbrio químico muito delicado, mantido cuidadosamente
pelo próprio cérebro. Ás vezes, devido a variações genéticas, estresses
intensos e duradouros ou doenças adquiridas, é necessário ter ajuda externa
para encontrar e manter esse equilíbrio através de medicamentos que interferem
na química cerebral. Algumas pessoas resistem a usa tais medicamentos, outras
acreditam equivocadamente, que os fitoterápicos são uma alternativa mais segura
(pois é fácil saber a dosagem do princípio ativo, e muitas vezes uma planta
pode estar misturada com outras e nem ser o que se deseja). Outras pessoas,
ficam tentadas, a usar medicamentos em busca de melhorias na memória e na
capacidade de atenção normais – mas mexer desnecessariamente no equilíbrio
delicado do cérebro não é uma boa ideia.
Combata o estresse crônico
O estresse vira
vilão quando se torna crônico ou inescapável: você quer se livrar dele mais não
consegue. Uma resposta de estresse prolongada e exagerada acaba por tornar ruim
para corpo e cérebro tudo que era bom. A melhor maneira de evitar os problemas
do estresse crônico é impedindo que ele aconteça. Se isso não é possível é preciso aprender a lidar bem com ele- ou se
preparar para tomar a resposta crônica ao estresse mais saudável, com
exercícios físicos, controle cognitivo e uma abordagem positiva
Faça exercícios regularmente
Além de
promover a saúde cardiovascular e, portanto, também do cérebro, os exercício
físico intenso é um dos maiores estabilizadores de humor que a neurociência
moderna conhece- e ainda favorece o aprendizado e a memória. A atividade
aeróbica combate a depressão e a ansiedade, promove a produção de neurônios
novos no hipocampo e aumenta a produção de substâncias neuroprotetoras que mantêm
os neurônios saudáveis. Pelos seus efeitos sobre cérebro e corpo, o exercício
físico regular é o que existe de mais próximo de um elixir da juventude.
Durma bem e bastante
O sono é
fundamental para o bem-estar. O cérebro descansa, mesmo sem parar de funcionar,
e reorganiza as memórias do dia. A falta de sono é um estresse forte para o
cérebro, e causa uma série de problemas, inclusive de memória. O sono é tão
importante que é autorregulador: quanto menos você dorme mais precisa dormir.
Eduque-se e assuma responsabilidades
Seu cérebro
tem uma capacidade incrível para aprender e dispõe de tudo que precisa para
isso: o gosto pelo desafio, o poder de usar a atenção para filtrar informações
irrelevantes, e a capacidade de lembrar-se do que foi importante – desenvolver suas
habilidades mentais ou seja, educar-se – é uma excelente maneira de tornar seu
cérebro ainda mais capaz de resolver problemas, ampliar seu repertório e ainda
prolongar o bem-estar e a vida. Além disso, a educação é uma maneira de ganhar
controle sobre própria vida, assumir
responsabilidades e subir socialmente, o que traz uma série de vantagens para o
bem-estar.
Cultive seus relacionamentos
A subordinação
é uma fonte importante de estresse social, mas não é a única. Mamíferos sociais
como o homem não foram feito pra fica sozinhos, e o isolamento é um dos
estresses sociais mais intensos. Saber que você conta com o apoio de amigos e
familiares, é fundamental. Além disso, o contato social, na forma de abraços,
beijos e carinhos, garante ao cérebro que você não está sozinho no mundo.
Busque e ofereça carinho
Talvez a maior
descoberta da neurociência nos últimos tempos seja o impacto do carinho sobre o
cérebro. Na infância, ele é a melhor indicação de que o bebê pode contar com
alguém que o aqueça, proteja e alimente e receber carinho nessa época ajuda o
cérebro a formar uma resposta saudável ao estresse. Na vida adulta, o carinho é
uma maneira poderosa de regular ansiedade e respostas exageradas ao estresse de
maneira geral. O mais importante, contudo, é que o carinho se autopropaga:
cérebros que recebem carinho se tornam mais carinhosos. Conquistar o bem-estar
e dar carinho aos seus filhos é investir desde já no bem estar se seus netos.
Encontre um propósito na vida
Para uns é
cuidar dos filhos, sobrinhos ou netos; para outros, dos alunos ou levar consolo
aos necessitados, apoio aos incapazes, justiça aos injustiçados. Talvez o maior
propósito da vida, seja... Permitir-nos
encontrar um propósito na vida, qualquer que ele seja. Sentir que se tem um propósito
é uma maneira de permitir ao cérebro se sentir nas rédeas das próprias ações,
no controle da própria vida. O trabalho voluntário é um exemplo: quem o faz se
sente tão no controle da própria vida que pode até escolher ajudar os outros.
Fazer o bem faz um bem enorme ao cérebro, não só ao ver os resultados, mas já
ao antecipar a satisfação que seu cérebro levará aos outros.
Por Prof. Suzana Herculano-Houzel, PhD
Disponível em: http://www.cerebromelhor.com.br/bemestar.asp
(Veja mais no livro Fique de Bem com seu Cérebro, de Suzana
Herculano-Houzel, ed. Sextante, 2007)