O meu objetivo maior ao escrever este texto, foi subsidiar uma reflexão sobre a importância de o educador compreender, a luz dos conhecimentos neurocientíficos, como o cérebro se organiza. Pois, de acordo com estudos recentes na área das Neurociências, conhecer suas funções, saber que existem períodos críticos para a aquisição das habilidades cognitivas e emocionais, bem como as potencialidades e limitações do sistema nervoso, pode tornar o trabalho do educador mais significativo e eficiente, contribuindo para a compreensão das dificuldades que se apresentam no processo de ensino-aprendizagem. O conhecimento ajuda a entender, a prevenir e intervir, ou seja, sabendo se o funcionamento cerebral da criança ou adolescente está dentro do esperado para a sua idade e a série que cursa a escola e/ou a equipe multidisciplinar podem pensar estratégias de encaminhamento ou a intervenção terapêutica adequada a cada caso.
NEURODESENVOLVIMENTO
O CÉREBRO, O PROFESSOR E A ESCOLA
Para alguns estudiosos
a escola - maior invenção cultural da humanidade – embora ainda não tenha se
dado conta, tem sido e para sempre será o fator mais importante de modificação
da expressão dos cerca de 24.500 genes de uma criança.
Enfatizam ainda a
importância da Neuroeducação como o ramo das Neurociências que tem como objetos
de estudo a Educação e o Cérebro. Este, entendido como um órgão social que pode
ser modificado pela prática pedagógica, e, que, muito tem contribuído para esta
conscientização, por entender que a Escola, o Professor e o nosso Cérebro são
“INSUBSTITUÍVEIS”[1].
A ênfase dada pelos
autores à necessidade de os educadores levarem em consideração em sua prática às
descobertas na área das neurociências, não significa deixar de lado seus
próprios métodos.
Mas, tão somente
aumentar seus conhecimentos sobre a complexidade, a plasticidade e a dinâmica
do neurodesenvolvimento e, assim poder individualizar o processo educacional, no
sentido de reabilitar deficiências, estimular habilidades, considerando as
diferentes fases do desenvolvimento infantil e a diversidade cerebral. Tornando
esse conhecimento um aliado no processo de ensino-aprendizagem para as práticas
inclusivas, sem que, contudo, seja necessário abandonar os conhecimentos e a
prática adquirida ao longo dos anos de magistério.
Neurodesenvolvimento
Estudos na área das
Neurociências[2]referem
que o cérebro começa a se formar desde o momento da concepção. E que a partir
da segunda semana, o tubo neural, considerado o primórdio da formação do
sistema nervoso central, começa a se formar e, por volta da quinta semana já
está totalmente formado dando inicio a uma série de eventos.
Por volta da vigésima
oitava semana, ocorre um processo de proliferação celular onde as células
nervosas aumentam de forma intensa. Para se ter uma ideia da intensidade deste
aumento, por volta da vigésima oitava semana, o embrião possui um número de
neurônios quarenta vezes maior que um indivíduo adulto, ocorrendo perda desses
neurônios ao longo do desenvolvimento, em um processo de diferenciação celular.
Entre a décima e décima
segunda semana gestacional, os neurônios são programados para migrar e
inicia-se o processo de migração neuronal. Isto ocorre, porque dentro do
cérebro existe um código que determina o caminho a ser seguido por este
neurônio até a área cerebral onde exercerá sua função.
Processo este, que
conta com a participação das células da Glia, cuja função é dar sustentação aos neurônios e auxiliar o seu
funcionamento. O que permite que
alguns neurônios que não são usados ou são pouco eficientes sejam eliminados,
trazendo um ajuste fino para as redes neuronais cerebrais. Processo este,
denominado de Apoptose – morte neuronal programada.
FIGURA 1
Alguns neurônios migram até sua posição definitiva
como se “deslizassem“ sobre um “cabo” de orientação (glia radial). Outros são
guiados por sinais químicos emitidos por moléculas de adesão, localizadas na
membrana de neurônios ou glia (adaptado de Brain Basics, 2002).
Após todos
esses processos, acontece no final da gestação, a sinaptogênese
– processo este, que permite que diferentes regiões do cérebro se comuniquem.
Ocorre em tempo diferente e para diferentes regiões do cérebro.
E, para que esta
comunicação ocorra de forma efetiva, no final da gestação até o início da idade
adulta, ocorre à mielinização, ou seja, placas de gordura são acopladas nos
axônios dos neurônios, facilitando a transmissão neuronal, através da aceleração da velocidade do
impulso nervoso, favorecendo a rapidez do processamento de informações, essencial
para o processamento cognitivo.
De acordo com o estudo
em questão, o processo de neurodesenvolvimento pode ocorrer de forma típica ou
atípica. Neurodesenvolvimento atípico é quando ocorre mutação em algum gene. Isto
porque, segundo o autor, nosso cérebro é composto por uma substância cinzenta. Substância esta, considerada o QG do nosso cérebro, constituída pelo corpo celular dos neurônios que processam a informação; e uma
substância branca composta dos axônios através dos quais o neurônio envia
informação para outro neurônio. Correspondem a cerca da metade do volume do cérebro,
e segundo alguns autores, até a mais. Interconectam varias áreas corticais e
estruturas subcorticais. Portanto, integrantes imprescindíveis na constituição
das numerosas redes neurais, e cuja interrupção leva ao aparecimento de
síndromes clínicas por desconexão[3].
FIGURA 2
O sistema nervoso central (cérebro e medula
espinhal) é composto de dois tipos básicos de células: o neurônio (1) e a glia,
que dá suporte estrutural e fisiológico, como o astrócito (4) e o
oligodendrócito (6). O neurônio é composto de corpo celular (1), núcleo (2) e
dendritos (3), por onde entra a informação e o axônio (5) e terminais (7) de
onde sai a informação eletroquímica (adaptado de Brain Basics, 2002).
O que diferencia as
formas de neurodesenvolvimento é que no neurodesenvolvimento típico, os
indivíduos começam com um número menor de substância branca que ao longo do desenvolvimento, vai aumentando linearmente, enquanto que, a substância cinzenta, muito embora comece
com um número menor, aumenta em volume após o nascimento, chegando ao ápice na
adolescência, e vai reduzindo gradativamente a partir da idade adulta.
Enquanto que no neurodesenvolvimento atípico, os
indivíduos começam com um número maior, tanto em relação à substância branca
quanto à substância cinzenta, ocorrendo perda de ambas de forma demasiada ao
longo do neurodesenvolvimento.
O autor conclui, que
uma explicação para isto é que existe um defeito na poda neuronal, o que
justificaria as dificuldades apresentadas pelos portadores de alguns
transtornos, como por exemplo, o autismo e a esquizofrenia de início precoce.
Para esses estudiosos,
o cérebro é um produto de diversas alterações desde a vida intrauterina, mais
precisamente, desde o momento da concepção até a idade adulta. E todo este
processo de transformações cerebrais que ocorrem ao longo desse período é
chamado de maturação cerebral.
Qualquer alteração no
curso natural deste processo trará problemas ao neurodesenvolvimento podendo
cursar com o surgimento de algum transtorno. Transtornos estes, que têm início no final da infância e início da
adolescência. O que sugere que nessa fase ocorrem alterações que deixam o
indivíduo vulnerável a transtornos psiquiátricos.
De acordo com estudos
recentes[4],
neurodesenvolvimento é a programação neurobiologicamente determinada de eventos
cerebrais moduladas por variações ambientais (culturais e historicamente
determinadas).
É ainda, o
desenvolvimento de formas mais progressivamente complexas de comportamento e
depende de aquisições cognitivas e comportamentais, tais como: influências
ambientais, maturação cerebral, neuromodulação, além das aprendizagens que vão
sendo memorizadas e internalizadas ao longo do tempo.
Sem esquecer que a qualidade dos cuidados à
criança tem impacto decisivo no desenvolvimento cerebral e somático, na
habilidade de aprender, controlar emoções e resistir às adversidades.
O que significa que somos
programados e nascemos com possibilidades de sermos e nos tornarmos em muitas
coisas diferentes, tendo a influência do ambiente no qual estamos inseridos como
moduladores dos nossos comportamentos.
Comportamentos esses, que
irão determinar não só as modalidades de aprendizagem, ou seja, a maneira como
cada um aprenderá e se relacionará com o conhecimento, bem como as escolhas e as
formas de se relacionar com os pares ao longo da vida.
Como por exemplo,
nenhum indivíduo foi neurobiologicamente programado para fazer parte desta ou
daquela cultura, falar esta ou aquela língua. São as influências culturais que
o predispõe a isto.
A autora
Francisca Maria Alves de Andrade Sousa é graduada em Letras/Português, Psicopedagoga Clínica e Institucional, Especialista em
Atendimento EducacionaL Especializado - AEE
; Pós-graduanda em
Neuropsicopedagogia, coautora do livroTRANSTORNOS E DIFICULDADADES DE
APRENDIZAGEM: Entendendo melhor os alunos com necessidades especiais,
com o artigo: Distúrbios e Dificuldades
de Aprendizagem: uma perspectiva de interface entre saúde e educação.
REFERÊNCIAS
[1] ARRUDA, Marco Antônio. Neuroeducação: O que é?
O que
mudar? 1ª JORNADA DE NEUROCIÊNCIAS DA
EDUCAÇÃO DE SÃO JOSÉ DO RIO PRETO
[2]
HOEXTER, Marcelo Q. Compreendendo o Neurodesenvolvimento: Contribuições
de Estudos de Neuroimagem. XI Congresso Brasileiro de
Neuropsicologia. Setembro (2011).