quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Crianças precisam de limites que as protejam



Texto extraído livro Limites Sem Trauma
(Construindo Cidadãos), de Tânia Zagury.
Dar limites é...

·        Ensinar que os direitos são iguais para todos.

·        Ensinar que existem OUTRAS pessoas no mundo.

· Fazer a criança compreender que seus direitos acabam onde começam os direitos dos outros.

·        Dizer "sim" sempre que possível e "não" sempre que necessário.

·        Só dizer "não" aos filhos quando houver uma razão concreta.

·        Mostrar que muitas coisas podem ser feitas e outras não.

·        Fazer a criança ver o mundo com uma conotação social (con-viver) e não apenas psicológica (o meu desejo e o meu prazer são as únicas coisas que contam).
·       
  Ensinar a tolerar pequenas frustrações no presente para que, no futuro, os problemas da vida possam ser superados com equilíbrio e maturidade (a criança que hoje aprendeu a esperar sua vez de ser servida à mesa amanhã não considerará um insulto pessoal esperar a vez na fila do cinema ou aguardar três ou quatro dias até que o chefe dê um parecer sobre sua promoção).

·        Desenvolver a capacidade de adiar satisfação (se não conseguir emprego hoje, continuará a lutar sem desistir ou, caso não tenha desenvolvido esta habilidade, agirá de forma insensata ou desequilibrada, partindo, por exemplo, para a marginalidade, o alcoolismo ou a depressão).

·         Evitar que seu filho cresça achando que todos no mundo têm de satisfazer seus mínimos desejos e, se tal não ocorrer (o que é mais provável), não conseguir lidar bem com a menor contrariedade, tornando-se, aí sim, frustrado, amargo ou, pior, desequilibrado emocionalmente.

·        Saber discernir entre o que é uma necessidade dos filhos e o que é apenas desejo.

·  Compreender que direito à privacidade não significa falta de cuidado, descaso, falta de acompanhamento e supervisão às atividades e atitudes dos filhos, dentro e fora de casa.

·      Ensinar que a cada direito corresponde um dever e, principalmente: Dar exemplo! 

Quem quer ter filhos que respeitem a lei e os homens tem de viver seu dia-a-dia dentro desses mesmos princípios, ainda que a sociedade tenha poucos indivíduos que agem dessa forma.

Dar limites não é...

·        Bater nos filhos para que eles se comportem.
·        Quando se fala em limites, muitas pessoas pensam que significa aprovação para dar palmadinhas, bater ou até espancar.
·        Fazer só o que vocês, pai ou mãe, querem ou estão com vontade fazer.
·        Ser autoritário, dar ordens sem explicar o porquê, agir de acordo apenas com seu próprio interesse, da forma que lhe aprouver, mesmo que a cada dia sua vontade seja inteiramente oposta à do outro dia, por exemplo.
·        Deixar de explicar o porquê das coisas, apenas impondo a "lei do mais forte".
·        Gritar com as crianças para ser atendido.
·        Deixar de atender às necessidades reais (fome, sede, segurança, afeto, interesse) dos filhos, porque você hoje está cansado.
·        Invadir a privacidade a que todo ser humano tem direito.
·        Provocar traumas emocionais, humilhações e desrespeito à criança.
·        Toda criança tem capacidade de compreender um "não" sem ficar com problemas, desde que, evidentemente, este "não" tenha razão de ser e não seja acompanhado de agressões físicas ou morais. O que provoca traumas e problemas emocionais é, em primeiro lugar, a falta de amor e carinho, seguida de injustiça, violência física.
·        Bater nos filhos é uma forma comum de
·        violência física, que, em geral, começa com a palmadinha leve no bumbum.

Para orientar os filhos não é necessário nenhum diploma
É preciso saber respeitar e ao mesmo tempo reprimir os nossos filhos, às suas devidas medidas. Não é através de violência ou de autoritarismo que se educa. Estas atitudes somente fazem adormecer nas crianças um sentimento reprimido que, em sua primeira chance, despertará das formas mais variadas e perigosas possíveis.
Saber orientar não significa de maneira nenhuma mudar a personalidade do filho, mas ajudá-lo a crescer e, portanto, saber encaminhar os seus progressos e conquistas. Para fazê-lo, é preciso:
·        Ter um comportamento realista, com o fim de compreender as capacidades concretas do filho, sem pretender exagerá-las nem subestimá-las. No primeiro caso, seríamos levados a fixar objetivos excessivamente elevados para o filho; no segundo, não lhe daríamos oportunidade de desenvolver os seus talentos ao máximo;
·        Saber motivar, isto é, apoiar-se em tudo o que o filho tem de positivo ao propor-lhe objetivos concretos e adequados;
·        Saber superar a nossa própria emotividade e os aspectos negativos do nosso caráter. Se efetivamente estamos dispostos a superar a nossa emotividade, mesmo que isso nos custe um grande esforço, estaremos mais preparados para compreender os nossos filhos.
·        Para isso não se necessita de nenhum diploma específico; é preciso esforçar-se, isso sim, com sinceridade e constância, para manter uma boa dose de flexibilidade interior.
Extraído do livro "Conheça o seu filho", da Editora Quadrante. Autora, Anna Maria Costa, psicóloga italiana.


Adaptado por Francisca Maria Andrade

Termos e significados usados na psicopedagogia e áreas afins



O conhecimento de alguns termos é de fundamental importância para profissionais da área de educação e saúde mental. Não é nossa intenção explanar sobre cada um deles, mas apresentar apenas um breve significado. Cabe ao profissional buscar outras fontes para se aprofundar sobre causas, sintomas e tratamentos.
·             Aprendizagem - É o resultado da estimulação do ambiente sobre o indivíduo já maturo, que se expressa diante de uma situação-problema, sob a forma de uma mudança de comportamento em função da experiência.
·             Agnosia - Etimologicamente, a falta de conhecimento. Impossibilidade de obter informações através dos canais de recepção dos sentidos embora o órgão do sentido não esteja afetado. Ex. a agnosia auditiva é a incapacidade de reconhecer ou interpretar um som mesmo quando é ouvido. No campo médico está associada com uma deficiência neurológica do sistema nervoso.
·             Afasia - Perda da capacidade de usar ou compreender a linguagem oral. Está usualmente associada com o traumatismo ou anormalidade do sistema nervoso central. Utilizam-se várias classificações tais como afasia expressiva e receptiva, congênita e adquirida.
·             Agrafia - Impossibilidade de escrever e reproduzir os seus pensamentos por escrito.
·             Alexia - Perda da capacidade de leitura de letras manuscritas ou impressas.
·             Anamnese - Levantamento dos antecedentes de uma doença ou de um paciente, incluindo seu passado desde o parto, nascimento, primeira infância, bem como seus antecedentes hereditários.
·             Anomia - Impossibilidade de designar ou lembrar-se de palavras ou nome dos objetos.
·             Anorexia - Perda ou diminuição do apetite.
·             Anoxia - Diminuição da quantidade de oxigênio existente no sangue.
·             Apnéia - Paragem voluntária dos movimentos respiratórios: retenção da respiração.
·             Apraxia - Impossibilidade de resposta motora na realização de movimento com uma finalidade. A pessoa não realiza os movimentos apesar de conhecê-lo e não ter qualquer paralisia.
·             Ataxia - Dificuldade de equilíbrio e de coordenação dos movimentos voluntários.
·             Autismo - Distúrbio emocional da criança caracterizada por incomunicabilidade. A criança fecha-se sobre si mesma e desliga-se do real impedindo de relacionar-se normalmente com as pessoas. Num diagnóstico incorreto pode ser confundido com retardo mental, surdo-mudez, afasia e outras síndromes.
·             Bulimia - Fome exagerada de causa psicológica.
·             Catarse - Efeito provocado pela conscientização de uma lembrança fortemente emocional ou traumatizante até então reprimida.
·             Catatonia - Síndrome complexa em que o indivíduo se mantém numa dada posição ou continua sempre o mesmo gesto sem parar. Persistência de atitudes corporais sem sinais de fadiga.
·             Cinestesia - Impressão geral resultante de um conjunto de sensações internas caracterizado essencialmente por bem-estar ou mal-estar.
·                Consciência fonológica - Denomina-se consciência fonológica a habilidade metalinguística de tomada de consciência das características formais da linguagem. Esta habilidade compreende dois níveis:
      1. A consciência de que a língua falada pode ser segmentada em unidades distintas, ou seja, a frase pode ser segmentada em palavras; as palavras, em sílabas e as sílabas, em fonemas.
      2. A consciência de que essas mesmas unidades repetem-se em diferentes palavras faladas (rima, por exemplo).
·             Coordenação viso-motora - É a integração entre os movimentos do corpo (globais e específicos) e a visão.
·             Disartria - Dificuldade na articulação de palavras devido a disfunções cerebrais.
·             Discalculia - Dificuldade para a realização de operações matemáticas usualmente ligadas a uma disfunção neurológica, lesão cerebral, deficiência de estruturação espaço-temporal.
·             Disgrafia - Escrita manual extremamente pobre ou dificuldade de realização dos movimentos motores necessários à escrita. Esta disfunção está muitas vezes ligada a disfunções neurológicas.
·             Disartria - Dificuldade na articulação de palavras devido a disfunções cerebrais.
·             Discalculia - Dificuldade para a realização de operações matemáticas usualmente ligadas a uma disfunção neurológica, lesão cerebral, deficiência de estruturação espaço-temporal.
·             Disgrafia - Escrita manual extremamente pobre ou dificuldade de realização dos movimentos motores necessários à escrita. Esta disfunção está muitas vezes ligada a disfunções neurológicas.
·             Ecolalia - Imitação de palavras ou frases ditas por outra pessoa, sem a compreensão do significado da palavra.
·             Ecopraxia - Repetição de gestos e praxias.
·             Enurese - Emissão involuntária de urina.
·             Espaço-temporal - orientar-se no espaço é ver-se e ver as coisas no espaço em relação a si próprio, é dirigir-se, é avaliar os movimentos e adaptá-los no espaço. É a consciência da relação do corpo com o meio.
·             Etiologia - Estudo das causas ou origens de uma condição ou doença.
·             Figura fundo - Capacidade de focar visivelmente ou aditivamente um estímulo, isolando-o perceptivamente do envolvimento que o integra. Ex. identificar alguém numa fotografia do grupo ou identificar o som de um instrumento musical numa melodia.
·             Gagueira ou tartamudez - distúrbio do fluxo e do ritmo normal da fala que envolve bloqueios, hesitações, prolongamentos e repetições de sons, sílabas, palavras ou frases. É acompanhada rapidamente por tensão muscular, rápido piscar de olhos, irregularidades respiratórias e caretas. Atinge mais homens que mulheres.
·             Gnosia - Conhecimento, noção e função de um objeto. Segundo Pieron toda a percepção é uma gnosia.
·             Grafema - Símbolo da linguagem escrita que representa um código oral da linguagem.
·             Hipercinesia - Movimento e atividade motora constante e excessiva. Também designada por hiperatividade.
·             Hipocinesia - Ausência de uma quantidade normal de movimentos. Quietude extrema.
·             Impulsividade - Comportamento caracterizado pela ação de acordo com o impulso, sem medir as conseqüências da ação. Atuação sem equacionar os dados da situação.
·             Lateralidade - Bem estabelecida - implica conhecimento dos dois lados do corpo e a capacidade de os identificar como direita e esquerda.
·         Hipocinesia - Ausência de uma quantidade normal de movimentos. Quietude extrema.
·             Impulsividade - Comportamento caracterizado pela ação de acordo com o impulso, sem medir as conseqüências da ação. Atuação sem equacionar os dados da situação.
·             Lateralidade - Bem estabelecida - implica conhecimento dos dois lados do corpo e a capacidade de os identificar como direita e esquerda.
·             Maturação - É o desenvolvimento das estruturas corporais, neurológicas e orgânicas. Abrange padrões de comportamento resultantes da atuação de algum mecanismo interno.
·             Memória - Capacidade de reter ou armazenar experiências anteriores. Também designada como "imagem" ou "lembrança".
·             Maturação - É o desenvolvimento das estruturas corporais, neurológicas e orgânicas. Abrange padrões de comportamento resultantes da atuação de algum mecanismo interno.
·             Memória - Capacidade de reter ou armazenar experiências anteriores. Também designada como "imagem" ou "lembrança".
·             Morfema - É a menor unidade gramatical. Na palavra infelicidade encontramos três elementos menores cada um chamado de morfema: in (prefixo), felic (radical), idade (sufixo). Os morfemas são utilizados para construir outras palavras: o prefixo in é utilizado em outras palavras como invariável, invejável, inviável, por exemplo.
·             Mudez - É a incapacidade de articular palavras, geralmente decorrente de transtornos do sistema nervoso central, atingindo a formulação e a coordenação das idéias e impedindo a sua transmissão em forma de comunicação verbal. Em boa parte dos casos o mutismo decorre de problemas na audição. Os fatores emocionais e psicológicos também estão presentes em algumas formas de mudez. Na mudez eletiva a criança fica muda com determinadas pessoas ou em determinadas situações e em outras não.
·             Paratonia - É a persistência de uma certa rigidez muscular, que pode aparecer nas quatro extremidades do corpo ou somente em duas. Quando a criamnça caminha ou corre, os braços e as pernas se movimentam mal e rigidamente.
·             Percepção - processo de organização e interpretação dos dados que são obtidos através dos sentido.
a) Percepção da posição - do tamanho e do movimento de um objeto em relação ao observador.

b) Percepção das relações espaciais - das posições a dois ou mais objetos.

c) Consistência perceptiva - capacidade de precisão perceptiva das propriedade invariantes dos objetos como, por exemplo: forma, posição, tamanho etc.

d) Desordem perceptiva - Distúrbio na conscientização dos objetos, suas relações ou qualidade envolvendo a interpretação da estimulação sensorial.

e) Deficiência perceptiva - Distúrbio na aprendizagem, devido a um distúrbio na percepção dos estímulos sensoriais.

f) Perceptivo-motor - Interação dos vários canais da percepção como da atividade motora. Os canais perceptivos incluem: o visual, o auditivo, o olfativo e o cinestésico.

g) Percepção visual - Identificação, organização e interpretação dos dados sensoriais captados pela visão.

h) Percepção social - Capacidade de interpretação de estímulos do envolvimento social e de relacionar tais interpretações com a situação social.
·             Preservação - Tendência de continuar uma atividade ininterruptamente; manifesta-se pela incapacidade de modificar, de parar ou de inibir uma dada atividade, mesmo depois do estímulo causador ter sido suprimido.
·             Problemas de aprendizagem - São situações difíceis enfrentadas pela criança com um desvio do quadro normal mas com expectativa de aprendizagem a longo prazo (alunos multirrepetentes).
·             Praxia - Movimento intencional, organizado, tendo em vista a obtenção de um fim ou de um resultado determinado.
·             Rinolalia - Caracteriza-se por uma ressonância nasal maior ou menor que a do padrão correto da fala. Pode ser causada por problemas nas vias nasais, vegetação adenóide, lábio leporino ou fissura palatina.
·             Ritmo - Habilidade importante, pois dá à criança a noção de duração e sucessão, no que diz respeito à percepção dos sons no tempo. A falta de habilidade rítmica pode causar uma leitura lenta, silabada, com pontuação e entonação inadequadas.
·             Sincinesia - É a participação de músculos em movimentos aos quais eles não são necessários. Ex.: coloca-se um objeto numa mão da criança e pede-se que ela aperte, a outra mão também se fechará ao mesmo tempo. Ficar sobre um só pé, para ela é impossível. Há descontinuidade nos gestos, imprecisão de movimentos nos braços e pernas, os movimentos finos dos dedos não são realizados e, num dado ritmo, não podem ser reproduzidos através de atos coordenados, nem por imitação.
·             Sintaxe - Parte da gramática que estuda a disposição das palavras na frase e a das frases no discurso, bem como a relação lógica das frases entre si e a correta construção gramatical; construção gramatical (Dicionário Aurélio)
·             Sinergia - Atuação coordenada ou harmoniosa de sistemas ou de estruturas neurológicas de comportamento.
·             Somestésico - Relativo à sensibilidade do corpo.

Bibliografia:

FONSECA, Vitor - Escola. Quem és tu? Porto Alegre: Artes Médicas, 1993.

ASSUNÇÃO, Elisabete da. COELHO, Maria Teresa. Problemas de aprendizagem. São Paulo, SP: Editora Ática, 2002. 

As atividades rotineiras são inconscientes, fazem com que o cérebro funcione automaticamente e requeira um mínimo de energia. Experimenta o inesperado.



As atividades rotineiras são inconscientes, fazem com que o cérebro funcione automaticamente e requeira um mínimo de energia. As experiências passam pelas mesmas estradas neuronais já formadas. Não há produção de neurotrofinas, proteínas que favorecem a sobrevivência dos neurônios.
ALGUNS EXERCíCIOS QUE EXPANDEM SUBSTANCIALMENTE OS DENTRITOS E A PRODUÇÃO DE NEUROTROFINAS:
1. TENTA, pelos menos uma vez por semana, tomar uma ducha com os olhos fechados. Só com o tato, localizar as torneiras, ajustar a temperatura da água, pegar o sabonete, o shampoo ou creme de barbear. Verás como tuas mãos notarão texturas que nunca havias percebido.
2. Utiliza a mão NÃO dominante. Come, escreve, abre a pasta, escova os dentes, abre a gaveta com a mão que mais trabalho te custe usar.
3. Lê em voz alta: distintos circuitos serão ativados, além dos que usas para ler em silêncio.
4. Troca tuas rotas, passa por diferentes caminhos para ir ao trabalho ou para casa.
5. Modifica sua rotina. Faça coisas diferentes. Sai, conhece e fala com pessoas de diferentes idades, trabalhos e ideologias. Experimenta o inesperado. Usa as escadas ao invés do elevador. Sai para o campo, caminha, ouça-o.
6. Troque a localização de algumas coisas. Saber onde tudo está o cérebro já construiu um mapa. Mude, por exemplo, o recipiente de lixo de lugar, e você vai ver o número de vezes que vai atirá-lo no o antigo local.
7. APRENDA uma habilidade. Qualquer coisa; pode ser fotografia, culinária, yoga, estudar um novo idioma. Se você gosta de quebra-cabeças ou figuras, cubra um olho para perder a percepção de profundidade, de modo que o cérebro tenha que confiar e buscar outras rotas.


Autor desconhecido - colaboração de Rosário Abreu Grilo

Desenvolvimento da criança, uma visão pediátrica



José Hugo de Lins Pessoa
Professor titular de Pediatria da Faculdade de Medicina de Jundiaí (FMJ).
Sinopse de Pediatria Nov 2003 V 9 N 3

Numeração de páginas na revista impressa: 72 à 77

Introdução


A supervisão do crescimento e do desenvolvimento da criança é uma importante tarefa médica e faz parte do rol de atividades do dia-a-dia do pediatra, uma vez que a Pediatria é a medicina do ser humano no seu período de crescimento e desenvolvimento.

O desenvolvimento da criança consiste na aquisição progressiva de capacidades (habilidades) motoras e psicocognitivas. Diferentemente do crescimento, que implica em divisão celular (hiperplasia) e/ou aumento do tamanho das células (hipertrofia) e resulta em ganho de massa corpórea, desenvolver é ganhar maturação funcional, capacidade para executar funções diferentes e/ou mais complexas. Embora sejam fenômenos distintos na sua concepção fisiológica, como bem assinala Marcondes, o crescimento e o desenvolvimento são paralelos em seus cursos e integrados em seus significados(1).

O desenvolvimento infantil abrange modificações no plano físico ou motor (capacidade para realizar movimentos), no plano intelectual (capacidade para pensar e raciocinar), no plano emocional (capacidade para sentir) e no plano social (capacidade para relacionar-se com os outros)(2). Pode ser considerado em cinco grandes áreas (domínios ou condutas): motor grosseiro, motor fino/adaptativo, pessoal/social, linguagem e cognitivo.

O desenvolvimento é regido e influenciado por fatores genéticos (intrínsecos) e ambientais (extrínsecos). Os fatores genéticos são responsáveis pela previsibilidade do desenvolvimento, ou seja, o desenvolvimento ocorre numa ordem semelhante para todos os indivíduos, entretanto em diferentes velocidades e resultados finais(4). Isto significa dizer que a seqüência do desenvolvimento é similar em todas as crianças, contudo, a velocidade de ganho das diferentes habilidades pode variar de uma criança para outra (e.g.: todas as crianças têm de aprender a andar antes de aprender a correr, no entanto idade de andar ou correr varia de uma criança para outra). Os fatores ambientais influem de modo relevante no desenvolvimento da criança. A pobreza e outros fatores sociais e culturais podem prejudicar esse desenvolvimento. Por outro lado, independentemente do nível socioeconômico da família, as atitudes e ações dos pais, a qualidade de vínculo e da estimulação da criança, influem na velocidade de aquisição de determinadas capacidades, sobretudo cognitivas e de linguagem(2).

O desenvolvimento é um processo contínuo, ordenado, cefalocaudal, paralelo à mielinização do sistema nervoso. Os marcos (ritos) do desenvolvimento refletem, portanto, a maturação do sistema nervoso. Antes de adquirir determinados movimentos voluntários tem que se perder os correspondentes reflexos primitivos (e.g.: antes que a criança possa rolar sobre si mesma, tem de desaparecer o reflexo tônico assimétrico do pescoço). Os reflexos primitivos se estabelecem através do tronco cerebral e se constituem de respostas motoras involuntárias diante de estímulos periféricos específicos. Estão presentes ao nascimento e desaparecem durante os primeiros seis meses de vida. A supressão dos reflexos primitivos está ligada ao desenvolvimento motor normal da criança, por exemplo, o reflexo de Moro desaparece gradativamente até ao final do 4º-6º mês de vida, o reflexo tônico cervical assimétrico desaparece aos 3-4 meses e a marcha reflexa desaparece aos 2-3 meses de idade. A persistência dos reflexos primitivos, além do tempo habitual, pode indicar lesão encefálica. As chamadas reações posturais (e.g.: de retificação, proteção, equilíbrio) surgem entre o 2º e 9º meses de idade e são importantes porque ajudam a manter a orientação do corpo no espaço e a inter-relação entre as diversas partes do corpo. No acompanhamento do desenvolvimento da criança o perfil gerado pela combinação dos reflexos primitivos (que devem desaparecer) e das reações posturais (que devem surgir) pode ajudar a identificar anormalidades.

A detecção precoce de crianças em risco de anormalidades no desenvolvimento pode permitir intervenções com grande impacto na saúde e no futuro da criança. A prematuridade, a exposição intra-uterina a drogas (e.g.: abuso de álcool e outras drogas pela mãe), eventos pré-natais e perinatais adversos (e.g.: infecções congênitas, anóxia), a presença de uma enfermidade crônica, doenças genéticas, desnutrição, além de fatores ambientais e socioculturais, podem implicar em um maior risco de problemas e atrasos no desenvolvimento da criança.

A avaliação do desenvolvimento da criança é realizada nas consultas pediátricas pela combinação da anamnese, do exame físico e, quando indicados, de exames complementares. O comportamento da criança, espontâneo ou provocado, durante o exame clínico é de grande utilidade para a caracterização da qualidade de aquisição dos marcos do desenvolvimento. Devem-se aquilatar os ritos (marcos) alcançados em cada uma das áreas citadas, considerando-se: I) as amplas variações de idade destas aquisições entre as crianças II) a velocidade em que se atinge os marcos de uma área pode não ser paralela com as outras. Note-se que embora exista uma unidade fundamental entre as diversas áreas do desenvolvimento, a existência de dissociações entre elas não reflete, necessariamente, uma condição de anormalidade. Os testes ou escalas de desenvolvimento (e.g.: teste do desenvolvimento de Denver II - Quadro 1) permitem uma comparação da situação do desenvolvimento atual da criança com outras da mesma idade.

ATENÇÃO! Esta imagem é muito grande para a internet podemos enviá-la por e-mail.


Sua utilização de maneira regular nas consultas pediátricas de rotina permite identificar, no momento oportuno, problemas no desenvolvimento da criança. A incapacidade de executar um marco do desenvolvimento realizado por 90% das crianças da mesma idade deve ser valorizada, sobretudo quando houver comprometimento em mais de uma área, e possibilita ao pediatra suspeitar de anormalidades. Releve-se, no entanto, que o teste do desenvolvimento de Denver possui uma elevada sensibilidade, porém uma especificidade limitada, o que significa dizer que crianças potencialmente normais podem ser remetidas para estudos adicionais. Nesse sentido, uma palavra de cautela: na avaliação do desenvolvimento infantil, em situações limítrofes, é importante observar o perfil longitudinal do desenvolvimento da criança, o que pode ajudar a diferenciarcom maior segurança déficits ou atrasos verdadeiros de simples atrasos sem significação clínica.

Desenvolvimento normal

1. Capacidades motoras grosseiras
As habilidades motoras grosseiras são representadas por movimentos globais de grandes músculos, correspondendo às capacidades como, por exemplo, de sentar, andar e correr. O desenvolvimento motor é realizado no sentido craniocaudal, próximo-distal e global-específico. Os movimentos sem coordenação das primeiras semanas de vida são substituídos por movimentos coordenados.

O processo de maturação motora reflete: I) as mudanças no tônus muscular de base II) o desaparecimento dos reflexos primitivos e III) o surgimento das reações posturais, que são integradas suavemente na função motora do individuo adulto. A chamada reviravolta fisiológica do tônus muscular observada no segundo trimestre de vida, ou seja, a troca do estado inicial da hipertonia dos membros e da hipotonia do tronco, é uma modificação estratégica porque permite ao lactente sentar-se, inicialmente com apoio das mãos (hipertonia do tronco), e oferece uma maior base de sustentação do corpo (hipotonia dos membros). Pode-se dizer que o "alvo" fundamental do desenvolvimento motor grosseiro no primeiro ano de vida é a marcha. A seqüência para isto é: controle da cabeça, fortalecimento dos músculos do pescoço, em seguida do ombro e do tronco e dos músculos da deambulação. É marco deste desenvolvimento sustentar a cabeça aos 3 meses, sentar aos 6 meses, ficar em pé, apoiando-se nos móveis, e engatinhar aos 9 meses e ficar em pé sem apoio e andar aos 12-14 meses. Aos 10-11 meses de idade algumas crianças andam, apoiando-se nas mãos dos pais ou do examinador. Outros marcos são, por exemplo: aprender a correr (18 meses), a subir e descer escadas (2 anos), a saltar sobre um pé (4 anos) e a saltar sobre os dois pés (5 anos). Do mesmo modo que nas outras condutas é necessária a presença do marco anterior para que o posterior se desenvolva.

2. Capacidades motoras finas (coordenação / motricidade fina)
O desenvolvimento motor fino ou adaptativo é representado pelo uso dos pequenos músculos, da mão e da coordenação olho/mão, resultando na capacidade de manipular pequenos objetos, escrever, desenhar e de toda a gama de ações que exige destreza manual.

O desenvolvimento motor fino no primeiro ano de vida tem na preensão em pinça de dois dedos, a chamada pinça superior, o seu aperfeiçoamento mais representativo. Entre um e quatro meses a criança tem a coordenação audiovisual, procura o som com a vista. As mãos que estão fechadas até os três meses de idade (reflexo de preensão palmar), passam a ficarem abertas a partir desta idade. Descobrem a linha média (3-4 meses), passam a jogar com as mãos nessa linha média. Após a perda do reflexo de preensão palmar no 3º-4º mês de vida existe um período, que pode durar dias ou até um mês, em que as mãos não reagem ao contato com os objetos (silêncio na preensão palmar). Aos 4-5 meses já procuram objetos que estão ao seu alcance (preensão palmar voluntária), aparecendo à coordenação oculomanual.

Aos 6 meses passam objetos de uma mão para outra e aos 7 meses iniciam a preensão de objetos com a pinça em três dedos (pinça radial inferior, onde já se observa o uso do polegar, ainda no mesmo plano). Entre 9 e 12 meses iniciam a preensão com pinça de dois dedos (pinça superior, onde se observa a oposição do polegar ao indicador) o que permitirá manipular minúsculos objetos. O uso do dedo indicador é importante porque permite a criança apontar, tocar e explorar o ambiente. Aos 14 meses faz uma torre com dois cubos e risca o papel com um lápis e aos 3 a 5 anos é capaz de copiar um círculo e um quadrado. Aos 6 anos desenha uma pessoa em seis partes. A preferência por uma das mãos, embora já possa ficar evidente aos 3 anos de idade, geralmente torna-se patente dos 4 aos 5 anos. A preferência precoce por uma das mãos deve lembrar a possibilidade de paresia ou problemas neuromusculares.

3. Linguagem
O desenvolvimento da linguagem representa a capacidade de comunicação, implica tanto a compreensão como a expressão através de palavras, frases e gestos que transmitem uma intenção. A linguagem é muito mais do que a fala, abrange todas as formas de comunicação humana. O desenvolvimento da fala é um rito muito importante e esperado com ansiedade pelos pais. Para o desenvolvimento da fala é essencial que a audição seja normal. Considera-se importante a mensuração da acuidade auditiva, não só em crianças portadoras de retardo da linguagem, mas como um procedimento de rotina no atendimento da criança sadia. A diminuição da capacidade auditiva pode ser congênita ou adquirida. A maioria dos casos de surdez congênita se deve a fatores genéticos(5). Entre as causas não genéticas, alguns exemplos de fatores de risco para hipoacusia são: as infecções congênitas (TORCH), o baixo peso ao nascer (< 1.500 g), asfixia neonatal e ventilação mecânica prolongada, malformações do pavilhão auricular, medicações ototóxicas, meningites, traumatismos cranioencefálicos e otite média com derrame persistente ou recidivante.

O desenvolvimento da linguagem obedece a uma sucessão ordenada e previsível. Os marcos podem ser considerados em receptivos (linguagem receptiva: capacidade para entender a comunicação) e expressivos (linguagem expressiva: capacidade para expressar uma intenção, verbal ou não). Os marcos receptivos se desenvolvem antes dos expressivos e, inicialmente, anunciam a capacidade para ouvir e responder aos sons e só posteriormente refletem a capacidade para entender as palavras. O recém-nascido reage aos sons com sobressalto, abertura dos olhos ou choro. Olhar nos olhos da mãe e posteriormente o surgimento do chamado sorriso social entre a sexta e décima semana de vida, já representam uma tentativa de linguagem. A vocalização (jogo vocal com variação de sons) surge em torno do terceiro mês, a lalação (repetição dos próprios sons) com o uso indiscriminado de falas como ma-ma-má, pa-pa-pá, entre 6 e 10 meses. Aos 9 meses de idade a criança compreende o "não" e em torno dos 12 meses de idade obedece a ordens acompanhadas de gestos e emite a primeira palavra discriminada, outra palavra que não ma-ma ou pa-pa. Nesta fase apresenta o chamado jargão ou palavra frase, uma palavra que dependendo da entonação pode representar uma frase. Rapidamente a criança adquire vocabulário, aos 2 anos já são em torno de 50 as palavras faladas.

Na prática da clínica do dia-a-dia o pediatra deve ficar atento aos sinais de alerta que indicam a possibilidade de complicação no desenvolvimento da linguagem e que indicam uma avaliação especializada. São sinais que sinalizam atrasos na linguagem: 1) respostas ausentes ou inconstantes a estímulos sonoros a qualquer idade 2) ausência de balbucio aos 9 meses de idade 3) ausência de fala (uma palavra) inteligível aos 18 meses de idade 4) incapacidade de responder a ordens simples, como "vem aqui", "cadê a mamãe?", aos 2 anos de idade 5) fala predominantemente não inteligível aos 3 anos de idade 6) hipernasalidade, qualidade vocal, tom e intensidade vocal inadequada a qualquer idade 7) gaguejar (tartamudear) de modo evidente após cinco anos de idade(5).

4. Capacidade pessoal-social
Nesta conduta se estabelece a relação da criança com o mundo que a rodeia e a autonomia para cuidar de si mesma (e.g.: alimentar-se, vestir-se). A capacidade pessoal- social reflete a interação da criança com o ambiente e com as pessoas, o processo de socialização e, paralelamente, o processo de independência pessoal. Acompanha o desenvolvimento da coordenação motora, a cognição e o demorado processo intrapsíquico do desenvolvimento do EU. Do estado de simbiose e dependência da mãe observados nos primeiros meses de vida a criança desenvolve o processo de separação, desvinculação e individuação.

O desenvolvimento pessoal-social transforma a criança em um indivíduo com capacidade para alimentar-se, vestir-se, cuidar da sua própria higiene corporal e participar dos jogos sociais. Ainda recém-nascido a criança já mira a face humana e entre a sexta e décima semana de vida surge o sorriso social não discriminado, espontâneo, marco importante porque traduz um desenvolvimento psíquico normal. Aos 6 meses de idade o sorriso da criança já passa a ser um ato discriminado. Aos 7-8 meses de idade surge a "ansiedade com estranhos", ou seja, da aceitação pela criança de todas as pessoas nos primeiros meses de vida, torna-se retraído e chora na presença de estranhos. Isto explica porque o recém-nascido e o lactente jovem (até 6 meses), geralmente, não choram durante o exame pediátrico.

Pode-se acompanhar o desenvolvimento pessoal-social da criança pelos marcos que demonstram a capacidade de interação com a mãe e com as outras pessoas e das capacidades para o seu cuidado pessoal como a alimentação e a higiene. Alguns exemplos: beber em copo aos 10-12 meses, usar a colher em torno dos 15 meses, aos 2- 3 anos lava e seca as mãos, participa de jogos de cooperação (interativo) aos 3-4 anos de idade e aos 4- 6 anos de idade a criança veste-se sem nenhuma ajuda ou supervisão. O hábito de brincar e jogar com as outras crianças é vital para a saúde mental, para o desenvolvimento da personalidade e para preparar o indivíduo para o convívio social adulto. O pediatra deve estar atento para estes fatos, uma vez que pode ajudar e estimular as famílias para a importância da integração social da criança.

5. Desenvolvimento cognitivo
As capacidades cognitivas permitem a criança a pensar, a raciocinar, a resolver problemas e a conhecer o seu ambiente. Segundo Piaget, são quatro os estágios do desenvolvimento cognitivo da criança: I) sensitivo-motor, do nascimento aos dois anos de idade II) pré-operativo, 2-6 anos III) operativo concreto, 6-11 anos IV) operativo formal, após os 11 anos de idade(3).

Uma visão geral do desenvolvimento cognitivo ressalta que na fase sensitivo-motor a criança estabelece um aprendizado do mundo mediante sensações e ações motoras. Aprende a noção de relações espaciais e de casualidade. Neste período é relevante o desenvolvimento do conceito de permanência do objeto (em torno dos sete aos nove meses de idade), isto é, a consciência que os objetos existem mesmo quando a criança não pode vê-los, uma vez que nos primeiros meses de vida só existe para a criança o que ela vê, ou seja, o que se encontra acessível ao seu campo de visão.

Com a aquisição da noção do conceito de permanência dos objetos se desenvolvem as bases para a elaboração intelectual "do que estar por vir" ou "por voltar". Nesse sentido, aos dois anos a criança desenvolve o conceito de "hoje", aos dois anos e meio o conceito de "amanhã" e aos três anos o conceito de "ontem". No período entre os dois e os seis anos de idade, os processos mentais da criança estão unidos a sua própria percepção de realidade, não separam, portanto, a realidade interna da externa. Sua visão do mundo é egocêntrica, relacionada ao seu querer ou as suas necessidades. Desenvolve nesta fase o pensamento mágico, pensamento simbólico incorporado de uma fantasia mais elaborada. Criam o amigo imaginário, pesadelos ou medo de monstros são comuns.

A partir do 5º-6º ano de idade a criança realiza operações mentais quando estão relacionadas com objetos reais (e.g.: duas laranjas mais duas laranjas igual a quatro laranjas). Nesta fase desenvolve importantes conceitos: de massa, volume e número. Interage melhor com as outras crianças, percebe as relações de causa/efeito. Após os 11 anos de idade a criança desenvolve, finalmente, o pensamento abstrato.

Em resumo: o desenvolvimento infantil apresenta um padrão normal, com marcos precursores e etapas-chaves com cronologia, regularidade e velocidades estabelecidas. Para bem acompanhar o desenvolvimento dos seus pacientes o pediatra deve conhecer e avaliar, para as respectivas idades, os ganhos de capacidades relacionados com as condutas nas diversas áreas.

Atraso no desenvolvimento

Pode-se dizer, de modo geral, que existe atraso no desenvolvimento quando uma criança não desenvolve os marcos do desenvolvimento na idade prevista. Deve-se, no entanto, considerar: I) que esta idade varia amplamente entre crianças normais II) que a criança em desenvolvimento pode mudar o curso (velocidade) de sua maturação, sendo fundamental um acompanhamento longitudinal III) que o atraso em uma área isolada tem muito menor significado do que o atraso em várias áreas.

Nos atendimentos pediátricos, independentemente de qual seja o motivo da consulta ou da queixa principal, deve-se sempre avaliar o desenvolvimento da criança. A ananmese completa é o primeiro passo. Da entrevista com a família e da observação do pediatra diante da criança obtém-se os dados vitais para a avaliação do desenvolvimento infantil. A história de aquisição dos marcos do desenvolvimento e a avaliação da família (mãe) quanto ao desenvolvimento da criança oferecem importantes subsídios para o pediatra. Devem-se verificar nos antecedentes familiares se existe algum membro da família com atraso no desenvolvimento. Os antecedentes gestacionais são importantes, ressaltando-se o uso de drogas ou álcool pela mãe durante a gravidez, as infecções congênitas, a prematuridade e as condições do parto. Nos antecedentes pessoais se deve ficar alerta para a existência de convulsões, exposição a intoxicações, meningites, padrão alimentar, história de maus-tratos ou abandono, ou seja, carência de estimulação.

O exame físico deve ser completo. O peso, a estatura e o perímetro cefálico devem ser colocados nas suas respectivas curvas e interpretadas adequadamente. A presença de malformações congênitas ou manifestações neurocutâneas podem indicar anormalidades genéticas. O exame neuropsicomotor é fundamental. Ressalte-se o estado do tônus muscular (hipotonia ou hipertonia), a massa e a força muscular.

São sinais de alerta e de orientação para atraso no desenvolvimento, dentre outros: 1) pouco interesse da criança pelo ambiente 2) choro estridente, inextinguível, irritabilidade 3) ausência de sorriso social 4) controle pobre da cabeça aos três meses 5- mãos persistentemente fechadas após os quatro meses 5) hipertonia de membros e hipotonia do tronco após o sexto mês 6) dificuldade de se manter nas posturas adequadas de acordo com a sua faixa etária (e.g.: não se sentar aos oito meses de idade) 7) ausência das reações equilibratórias ao final do terceiro trimestre de vida (pára-quedas e equilíbrio lateral) 8) preensão inadequada, ausência de preensão tipo pinça na idade adequada 9) inércia psíquica 10) persistência dos atrasos observados em exame anterior, uma vez que o encontro de atraso do desenvolvimento deve indicar avaliações mais freqüentes da criança para confirmação e identificação da sua causa(6,7).

Alterações em várias áreas devem alertar o pediatra para a urgência do diagnóstico e do tratamento. O grande objetivo da identificação e do diagnóstico precoce do atraso do desenvolvimento de uma criança, e da conseqüente intervenção precoce, geralmente multiprofissional, é contribuir para que cada criança adquira seu máximo potencial individual, finalidade da Pediatria.

Diagnóstico diferencial do atraso do desenvolvimento

No diagnóstico diferencial de uma criança com atraso do desenvolvimento sugere-se: 1) determinar a área ou áreas em que existir atraso. A criança pode ter uma anormalidade do desenvolvimento global ou em uma única área (e.g.: linguagem) 2) se existir atraso motor determinar se é progressivo ou estático. O exemplo clássico de doença motora estática é a paralisia cerebral 3) verificar se houve perdas de ganhos. Quando existiu anteriormente desenvolvimento normal e, posteriormente, ocorreu lentidão ou perdas dos ganhos já obtidos deve lembrar-se de doença metabólica, ou neurodegenerativa, ou lesão adquirida no sistema nervoso (medula ou encéfalo) 4) verificar se existe comprometimento profundo na interação social (ausência de contato ocular), movimentos corporais rítmicos habituais, como balanço do corpo, inclinação da cabeça, padrões restritos, repetitivos e estereotipados do comportamento, o que obriga a lembrar dos distúrbios do espectro do autismo 5) realizar avaliação especializada da visão e da audição. A determinação da acuidade auditiva é capital para diferenciação de surdez, retardo mental ou atraso na aquisição da linguagem (crianças que não têm perdas da audição, nem anormalidades anatômicas do sistema vocal, nem retardo mental ou retardo global do desenvolvimento são os chamados "faladores tardios"). A mensuração da audição é possível de ser realizada em crianças de qualquer idade, incluindo recém-nascidos. As técnicas a serem utilizadas dependem da idade da criança (e.g.: potencialevocado auditivo do tronco cerebral (PEAT) que não requer cooperação da criança e pode ser usado em qualquer idade) 6) se o exame físico demonstrar alterações dismórficas, indicar estudos genéticos 7) quando existem convulsões ou outros dados neurológicos podem ser indicados estudos de imagens do crânio (e.g.: ressonância magnética) e outros (e.g.: EEG) 8)realizar estudos do metabolismo (e.g.: aminoácidos) e da tireóide quando indicados pelo achados clínicos 9) não deixar de encaminhar (precocemente) a criança e a família para avaliação adicional (neurológica e/ou outras) nos casos de dúvidas ou naqueles que precisam de algum tratamento especializado.

O atendimento pediátrico ocupa uma posição de destaque na identificação das crianças em risco ou com atraso no desenvolvimento neuropsicomotor. Neste sentido, cabe ao pediatra uma responsabilidade ímpar: contribuir para que as crianças vivam melhores.


Bibliografia
1. Marcondes, E. - Desenvolvimento da criança: desenvolvimento biológico crescimento. Soc. Bras. Ped. 1994 75p.
2. Torralva, T. et al. - Desarrollo mental y motor en los primeros años de vida: su relación con la estimulación ambiental y el nivel sócio-económico. Arch. Argent. Pediatr 1999 97(5):306.
3. Grover, G. - Desarrollo normal y valoración del desarrollo. In: Berkowitz, C. D. Pediatria en atención primaria. McGraw-Hill, México, 1998. p.60-65.
4. Pessoa, J.H.L. - Densidade mineral óssea da região de punho e mão em crianças pré-púberes: correlação com as idades cronológica e óssea, o peso corporal e a estatura. S.Paulo, 1997. Tese doutorado. FCMSCSP.
5. Grover, G. - Desarrollo del lenguage: valoración del habla y de la audición. In: Berkowitz, C. D. Pediatria em atención primaria. McGraw-Hill, México, 1998. p.67-71.
6. Sayeg, D.C. & Porto, M.A.C.S. - Desenvolvimento da Criança, Pronap, Ano I, Soc. Bras. Ped. 1996 1 (3), 59-79.
7. Pires, M.M.S. - Avaliação do Desenvolvimento Neuropsicomotor Pronap, ciclo II, Soc. Bras. Ped.1998 2 (3): 32-57.